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Marcel Proust - Os Prazeres e os Dias

Page history last edited by Helena Barbas 15 years, 5 months ago

 

Marcel Proust


 Os Prazeres e os Dias 


 

Do snobismo à elegância como virtude que impede o aburguesamento

 

   Talvez intitulado por analogia irónica com Os ­Trabalhos e os Dias de Hesíodo, Os Prazeres e os Dias ­de Marcel Proust - uma pequena colecção de versos e ­esboços de retratos - foi publicado pela primeira vez ­em 1896, com um prefácio onde Anatole France saúda a ­estreia do jovem autor.

     Assim, pelo tom e estilo, os textos, que reflectem o­ esteticismo diletante em moda no final do século, pertencem ainda a uma retórica eminentemente escolar: encontram-se traços de La Bruyère, influência da­ Itália stendhaliana (Proust só visita Veneza em 1900), ­da Comédia Humana de Balzac, das personagens (Bouvard­ e Pécuchet) de Flaubert. Todavia, os temas, e por­ vezes o próprio discurso, por entre sinestesias algo­ simbolistas, e certos excessos e exageros ainda românticos, prefiguram já a originalidade de Em Busca do Tempo Perdido.

     As personagens aqui retratadas exibem-se como tipos ­sociais, na sua maioria aristocratas - verdadeiros e­ falsos (os arrivistas) - todos eles, e cada um à sua ­maneira, dominados pelo snobismo: «O facto é que,­ consoante a natureza de cada um, este adquiria formas­ diferentes, e ia uma grande distância do snobismo imaginativo e poético de Madame Lenoir, ao snobismo ­conquistador de Madame de Toreno, ávida como um funcionário que quer alcançar os postos cimeiros.» ­(p.126). Ali só o snobismo, que reveste as mais ­variadas formas, obedece também a uma hierarquia – o ­seu mais alto grau é a elegância - e é valorizado como ­a virtude que impede o aburguesamento.

 

   Outros temas caros a Proust são já aqui explorados: a­ inter-penetração entre o sonho e o real, onde o­ primeiro se prolonga e sobrepõe à própria vida como ­uma alternativa superior, uma lei cujas regras deverão ­ser obedecidas; o sobrevalorizar da imaginação na ­relação amorosa, e a ela associada, a intransponibilidade do corpo, donde resulta um ­paradoxo: fonte de desejo e ciúme, o corpo ergue-se ­como obstáculo ao amor puro e total (platónico), mas este não reconhece a individualidade do objecto amado, ­generaliza-se à espécie humana.

 

   Amor e morte, desejo e frustração, ciúme e­ indiferença, são os grandes sentimentos analisados ­através destas pequenas parábolas, uma curiosidade literária que permite avaliar a evolução na escrita de­ um mestre.

 

Helena Barbas [O Independente, 30 de Junho de 1989, III p.49]

 

 


 Os Prazeres e os Dias - Marcel Proust, trad. Manuel João Gomes (e Luiza Neto Jorge), ­Estampa, Lisboa (1989)


 

 

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