Luis de Cernuda
Antologia Poética
Luis de Cernuda Bidon, nasceu em Madrid, a 21 de Setembro de 1902, vindo a falecer em Novembro 1963, no México. A sua infância terá sido silenciosa e solitária, entre pais austeros e duas irmãs mais velhas. Começa a escrever versos aos catorze anos, mas destrói todos os esboços poéticos da adolescência.
Em 1927 edita Perfil do ar, um conjunto de 23 poemas já publicados dois anos antes, na «Revista de Ocidente», por interferência de Pedro Salinas. O livro é mal recebido pela crítica (e o poeta não o vai esquecer), mas leva a que Cernuda venha a ser incluído na «generación de 27», nome dado ao grupo que se destacou quando do centenário da morte de Góngora, em Sevilha. Lorca, Alberti, Dámaso Alonso, Jorge Guillén e Pedro Salinas, encabeçados por Juan Rámon Jiménez, elegem Góngora como seu representante, um outro defensor da poesia pura, hipotético antecessor das formulações de Valéry. Cernuda, apenas espectador no momento, acaba por estabelecer laços de amizade com os outros poetas.
Depois intitulados Primeiros Versos, aqueles poemas revelam já algumas das características próprias que se irão desenvolver na obra posterior: o diálogo formal com os grandes do «siglo de oro», como Garcilaso, e temático com os franceses Reverdy e Mallarmé, depois substituídos pelos surrealistas, Éluard, Breton e Aragon em Um rio, um amor de 1929. Neste ano, Cernuda está em Toulouse como leitor, a primeira das viagens que acabarão por se transformar em exílio.
Dois anos depois começa Os prazeres proibidos. Ao abandono do automatismo inconsciente corresponde um aumento do tom lírico. Mantém, no entanto, algumas das técnicas surrealistas, e os versos tornam-se mais longos. Sob o tema do amor expõe e defende a vivência dolorosa da homossexualidade, explorando a dicotomia entre o desejo de posse e a distância relativamente ao objecto amado: «Aproximava apenas um corpo interrogante,/ Porque ignorava que o desejo é uma pergunta/ Cuja resposta não existe.» («Não Dizia Palavras»).
Em Onde Habite o Esquecimento (1932-33) ressalta a mágoa, num esboço da determinação existencial que marcará a produção poética seguinte: o regresso à Natureza e aos deuses da mitologia clássica onde, ecoando Hölderlin, aqueles surgem como as mais antigas e verdadeiras representações do amor. A perspectiva pagã alia-se à sublimação amorosa e ao tom passional de Invocações, em simultâneo com a, sempre presente, crítica das convenções sociais e hipocrisia moral. Estes versos são publicados em1936, o ano da Guerra Civil, e data da primeira compilação do autor La Realidad y el Deseo, editada por José Bergamín.
Com a subida de Franco ao poder, em 1939, o poeta republicano, e que pertencera ao partido comunista, vê-se obrigado ao exílio. Primeiro em Inglaterra, depois Paris, de novo a Grã-Bretanha - ensina no Surrey, em Glasgow e Cambridge. Em 1947 vai para os Estados Unidos. De uma visita ao México em 51, e de um encontro inesperado, saem os Poemas para um corpo. As semelhanças com a sua terra natal levam-no a mudar-se para aquele país em 1952, onde fica a residir cerca de dez anos.
A terceira edição de Realidad y Deseo (1956) abre caminho para a fase poética «da maturidade» com As Núvens, onde se denotam já influências inglesas - Shakespeare, Blake, Keats, Browning, mas principalmente T. S. Eliot. O tom é clássico, coloquial, de uma calma nostalgia, prefigurando a aceitação da morte. Pelo uso da segunda pessoa - o «tu» - Cernuda explora a tendência para o monólogo interior, que por vezes raia o dramático. Ao cepticismo e angústia temporal associa-se o desejo de reter o presente. O poeta contempla-se a si próprio, e aceita, humildemente, perder-se no esquecimento: «Tudo tem o seu preço. E eu paguei/ O meu por aquela antiga graça;/ E assim desperto, achando após meu sono/ Um leito só e a hirta madrugada.» («Tristeza da Recordação»). Mas a amargura reaparece em Desolação da Quimera (1956-62) – título retirado de um verso de Eliot.
Regressando aos poemas curtos, à oposição amargo-doce do amor, «sem Ítaca à espera e sem Penélope», o poeta exilado fala de si e da sua poesia, recordando os desaires iniciais: «O que escrevo. Incomoda-vos? Ofende-vos./.../...caístes sobre um livro/ Inexperiente como o seu autor: eu, o meu primeiro livro./ Alguma coisa vos ofende, sem razão, no homem e sua obra.» («Aos seus Compatriotas»).
Cernuda poderá ser apreciado em português, muito em breve, numa tradução de José Bento, editada pela Cotovia, com a qualidade a que já nos habituaram. Não perca.
Helena Barbas [O Independente, 7 de Dezembro de 1990, III p.64]
Antologia Poética - Luis de Cernuda, trad. José Bento, Cotovia, Lisboa (1990)
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